Por Alessandro Cosin *
Para além do horizonte macroeconômico, as empresas têm enfrentado uma agenda cada vez mais urgente: a tão propagada, e ainda pouco internalizada, transformação digital. Essa é uma agenda global e local, das grandes, médias e pequenas empresas. No mercado brasileiro, até o momento, constatamos que a transformação está mais focada na digitalização das relações com os consumidores.
Há diversos exemplos de novas soluções para o e-commerce, como transações mais amigáveis, rápidas e seguras, além de novos canais de atendimento e relacionamento. No entanto, se partirmos da ideia central da revolução digital, que é repensar o próprio cerne do negócio a partir da gama sem precedentes de tecnologias já à disposição, temos ainda poucos casos brasileiros.
Com startups surgindo de forma frenética e recebendo aportes milionários, muitas empresas mais tradicionais enfrentam riscos reais de continuidade, uma vez que esses novos concorrentes já nascem com as novas tecnologias em seu core business, e livres de amarras de preconceitos anteriores. Na melhor das hipóteses, é um novo concorrente. Na pior, um substituto que pode acabar com mercados inteiros, a exemplo do que ocorreu com a indústria fonográfica e a difusão digital de músicas.
Logo, as empresas precisam avançar seu nível de maturidade para além da mera digitalização de canais com agilidade e de forma organizada. As oportunidades em termos de tecnologias à disposição são vastas, mas algumas aparentam estarem mais prontas para sua aplicação no curto prazo.
É o caso, por exemplo, da Internet das Coisas (IoT). Ela já é uma realidade, motivada pela utilização maciça dos smartphones, que trazem a tecnologia embarcada, e promovem a interação de sensores e conexão com a rede, ampliando a capacidade de coletar e transmitir dados. Várias empresas têm anunciado aplicações para gestão de estoque e logística, comunicação com clientes, meios de pagamento, segurança etc. Essas iniciativas são ainda localizadas, mas poderiam abranger cadeias de valor por completo.
Outra tecnologia emergente em 2019, embora menos madura, é a Inteligência Artificial (IA). Na maioria dos casos, ela está em fase de testes e prova de conceito, com a aplicação sendo pensada desde chatbots até mineração de dados para identificar padrões, comportamentos e outras questões afins. Ou seja, já temos casos concretos, mas eles estão mais restritos aos bastidores. Neste ano, esperamos que a AI chegue ao “front end”, conversando com consumidores e até executando tarefas de média complexidade.
Já a tecnologia de realidade virtual e aumentada tem seu espaço garantido com aplicações muito concentradas em treinamentos, simulações e jogos. A tecnologia está pronta, agora é hora de explorar suas funções para colocá-la em prática, internamente e, principalmente, para os consumidores.
Em um horizonte um pouco mais longo (dois ou três anos), despontam o blockchain e as impressoras 3D. No primeiro caso, temos muitas ideias e potencial, mas poucos casos práticos. Os bancos, a área de saúde, os setores do governo e as startups devem ser as pioneiras neste segmento no Brasil, abrindo caminho para uma disseminação mais ampla nos próximos anos.
Lembrando que para muitas das aplicações, como os contratos inteligentes, complexas mudanças regulamentares e legais são necessárias, bem como a mudança de mentalidade do mercado, no sentido de compartilhar mais informações, e até o controle centralizado de alguns processos. Já as impressoras 3D esbarram ainda nas questões do custo e aplicações, que vão além da simples produção de testes e modelos. Outras aplicações mais radicais como a impressora de alimentos ainda são uma realidade distante e incerta.
Outro fator que impacta a transformação digital no Brasil em 2019 é a nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), promulgada em agosto de 2018, cujas regras entrarão em vigor em agosto de A lei prevê uma série de obrigações em termos de uso, sigilo e guarda de informações às quais as empresas terão que se adaptar. Na maioria dos casos, mudanças de procedimentos e regras internas serão suficientes para o atendimento das normas. Em outros casos, será necessário o desenvolvimento de novos sistemas, o que abre espaço para negócios e inovação.
Temos apenas que ficar atentos a prováveis regulamentações da nova lei que devem ocorrer neste ano. Com um cenário político mais definido e indicadores macroeconômicos em ascensão, a transformação digital no Brasil tende a ganhar mais tração, com a maior disposição das empresas e agentes econômicos em se apropriar desse tema e investir. Para isso, as empresas, independentemente se têm ou não alta capacidade de investimentos, devem criar radares para acompanhar o que está acontecendo em termos de tecnologia no seu segmento.
E para gerar seus insights, vale também ficar de olho em casos de referência aqui e em outros países, disponibilizados pelos grupos de comunicação, por fornecedores de tecnologia e consultorias.
Outro caminho é implementar internamente ou participar de programas de aceleração de startups, de incubação de empresas de tecnologias relacionadas ao seu business. É importante ressaltar que o processo de inovação não acontece somente de dentro para fora, é necessário acompanhar e absorver essa competência também no sentido contrário.
* Alessandro Cosin é CEO da Cosin Consulting Linked by Isobar