Executivo afirma que dados gerados por automóveis
serão mais lucrativos que os próprios veículos
Muitos dos carros fabricados atualmente contam com mais de 100 sensores embarcados, capazes de monitorar permanentemente itens como velocidade, temperatura do motor e funcionamento dos freios, coletando muitas informações. Estes sensores fazem com que estes automóveis produzam cerca de 25 GB de dados por hora.
E se tratarmos de carros autônomos, a previsão é de que este volume cresça para incríveis 3.600 GB por hora.
Em entrevista exclusiva com Luz G. Mauch, Vice Presidente Sênior de Vendas e Serviços Automotivos da T-Systems, pudemos tirar muitas dúvidas a respeito de conectividade, em que o executivo deixou bem claro que os carros estão se tornando data centers sobre rodas. E justamente por isso, é hora do mercado se preparar para trabalhar com estes dados.
“Os dados são gerados constantemente, Eles são produzidos em toda a cadeia de valor, do design e desenvolvimento, produção, vendas e uso, até as revisões e manutenção”, diz, lembrando haver um consenso entre especialistas de que empresas com capacidade de coletar, integrar e analisar estes dados com inteligência estarão entre os vencedores da revolução digital.
Mercado
A tendência é um grande salto evolutivo em todo o processo nos próximos anos. “As rotas do passado não são as rotas do futuro, o mercado é muito volátil e hoje uma empresa que é sua concorrente, sua competidora, amanhã poderá ser sua parceira no desenvolvimento de tecnologias a fim de alavancar novos negócios”, diz Mauch.
“As empresas serão capazes de melhorar a
eficiência de uma série de processos e
de abrir novas possibilidades de vendas”
E cita três exemplos já existentes no mercado:
1. Manutenção preditiva em produção automotiva
De acordo com a IFR (International Federation of Robotics), 2,6 milhões de robôs estarão em uso até 2019, muitos deles já em operação. Um carro médio tem cerca de 6 mil pontos de solda. Se um único robô de soldagem tem uma parada inesperada, toda a linha é paralisada, causando prejuízos de cinco a seis dígitos para o fabricante. Há dados de medição e consumo de energia que permitem prever uma parada deste tipo com seis dias de antecedência, permitindo que a manutenção trabalhe de forma programada.
2. Seguro automotivo pago por uso do carro
Poucas seguradoras utilizam tecnologia telemática para monitorar o comportamento dos motoristas, premiando hábitos de direção segura com taxas mais baixas. Uma caixa telemática, ou mesmo o smartphone, pode ser utilizado para gravar estes dados e enviá-los para a companhia seguradora. Se o automóvel tiver um SIM card instalado, estes dados podem ser transferidos sem problemas. Seguradoras e fabricantes de automóveis já estão trabalhando para estabelecer um framework legal que permita o fornecimento de dados relevantes para as seguradoras.
3. Semáforos que reconhecem veículos de emergência
muitos semáforos já estão equipados com câmeras de monitoramento, permitindo sua otimização de acordo com o fluxo. A cidade de Milton Keynes, na Inglaterra, está equipando seus cerca de 2,5 mil semáforos com câmeras inteligentes capazes de reconhecer ambulâncias e mudar as fases para permitir sua passagem.
Lucratividade
A grande questão para as empresas é como ganhar dinheiro com essa cadeia de informações. “A conectividade é um ponto crucial para a T-Systems, para que possamos potencializar os serviços e disponibilizar novas formas de monetização”, afirma Mauch.
“As empresas precisam aprender como fazer a aproximação com esse ‘novo’ cliente, a chave está em como lidar com esse novo cenário, com a informação correta, no local correto e a qualidade necessária para o serviço bem feito nesse novo processo de negócio. O nível atual de conectividade, em uma escala de 1 a 5, eu acredito estar alcançando o nível 3, o que ainda é insuficiente para alguns tipos de serviços e informações. A evolução é constante e acredito que teremos um grande salto nos próximos anos”, diz o executivo.
O mercado precisa, para potencializar os dados produzidos por veículos, desenvolver mais conectividade, capacidade de armazenamento e softwares inteligentes. De acordo com o Gartner, um em cada cinco veículos serão equipados com alguma forma de conexão sem fio até 2020, que devem totalizar cerca de 250 milhões de veículos globalmente.
“Outra tecnologia, chamada NarrowBand IoT, está destinada para o gerenciamento de estacionamentos inteligentes e outras aplicações do tipo”, afirma. Trata-se de uma rede WAN que não apenas estende a vida dos sensores operados por bateria, como funciona em prédios e garagens subterrâneas, sinalizando vagas livres para os motoristas.
Os softwares também estão se tornando incrivelmente avançados, alguns inclusive com funcionalidades de aprendizado. “De acordo com a McKinsey, as soluções de inteligência artificial vão ampliar o ROI da indústria automotiva em 9% até 2025, com maior potencial de crescimento nas áreas de produção e compras”, revela.
O executivo afirma que, neste momento, a criatividade torna-se o recurso mais importante, permitindo às empresas desenvolverem novos serviços, modelos de negócio e fontes de receita baseadas em dados veiculares. “Na verdade, pode ser o início de uma corrida do ouro moderna, porque no futuro será possível fazer mais dinheiro a partir dos dados veiculares do que da produção em si”, prevê.
Para comprovar sua previsão, o executivo lembra que a margem de lucro dos fabricantes de automóveis geralmente gira em torno de 10%. Por outro lado, a margem de empresas especializadas em processamento de dados, é de cerca de 30%. A questão é: quem vai abocanhar este lucro? Para o executivo, já há no mercado uma competição sobre o uso comercial de dados veiculares.
“Fabricantes, fornecedores e startups estão considerando as oportunidades e enfrentando a competição de empresas de outros segmentos, como a Apple e o Google, que já descobriram o potencial deste mercado e têm conhecimento e musculatura financeira para agita-lo. A luta pelos dados automotivos está apenas começando”, conclui.
Segurança
Outro ponto que o executivo ressaltou é a questão da segurança destes dados. “Este é um ponto crucial tanto para a T-Systems quanto para nossos parceiros e clientes. Garantir a integridade dos dados, a segurança, é uma busca constante. Na Europa já existem regulamentações a respeito, como a questão do sistema de chamadas de emergência eCall em todos os carros da União Europeia, em que todos os veículos devem ser equipados até o final de março deste ano com um SIM card.
“Temos que garantir o envio da informação correta para o destino correto, no tempo certo. O ajuste de prioridades é algo essencial quando se envia informações pela rede”, afirma Mauch. “Uma informação a respeito de um acidente deve ser prioritária quando comparada a um download de um vídeo no YouTube, por exemplo”.
Veículos autônomos
Mauch diz que “a grande pergunta é: em um carro autônomo, o que o motorista faz no seu tempo livre durante um trajeto? Apenas ficar sentado não é interessante, por isso pergunto o que podemos oferecer como acessório para essa pessoa”.
“Pessoalmente eu não acredito que veículos autônomos só estarão disponíveis ao redor do mundo após a disseminação da tecnologia 5G. Este é um elemento a mais a partir do momento que você entrega conteúdo para o carro”, conclui.
Acidentes
Sobre os acidentes ocorridos nos EUA (com o Google e o Tesla), o executivo foi enfático. “Isso gerou uma série de importantes discussões, de como devemos proteger o motorista, proteger os pedestres e como a indústria deve lidar com isso, seja ela a tradicional fabricante de veículos ou novas empresas de tecnologia envolvidas. Precisamos entender de quem são algumas responsabilidades, se do motorista, do fabricante do carro ou do provedor de tecnologia, e aqui cabe ainda muita discussão e é necessária uma regulamentação”, diz.
“Na minha visão, em caso de um acidente as pessoas vão buscar diretamente o OEM. Mas será esse o caminho? E as seguradoras, como entenderão estes casos? Será a responsabilidade exclusiva do proprietário do carro? Enfim, são muitas variáveis”, conclui.
“Enfim, é isso que a T-Systems acredita e busca constantemente: a qualidade da rede em termos de conectividade, que será um elemento essencial para o futuro dos veiculos conectados. Está tudo relacionado aos dados”.