Por Paulo Exel *
Após ler inúmeras reportagens e pesquisas sobre o futuro do trabalho previsto para 2022 – com o aumento da vacinação e uma possível melhora da pandemia – me deparei com vários paradoxos. Percebi que estamos vivendo situações até então inimagináveis e, principalmente, contraproducentes. Isso me levou a refletir sobre cinco grandes paradoxos que iremos enfrentar no próximo ano:
Falta oportunidades ou há escassez de profissionais?
Já há algum tempo, o Brasil sofre com altas taxas de desemprego, que chegaram a ultrapassar a marca dos 14 milhões em 2021, segundo dados do IBGE. Por outro lado, temos vagas sobrando, principalmente na área de TI. Esse abismo foi ainda mais acentuado durante a pandemia, quando os profissionais com menos qualificação foram justamente os mais atingidos.
E, se já não era preciso ter um vendedor disponível na loja física, por outro lado, foi preciso um exército de profissionais para contribuir com a tão “rotulada” transformação digital das empresas (que, na minha opinião o termo correto deveria ser “transformação cultural”), levando-as quase que do dia para a noite para o ambiente virtual. Tecnologia se tornou uma questão de sobrevivência.
As universidades continuam incapazes de formar a quantidade de profissionais demandada pelo mercado atualmente. Sendo assim, cabe às próprias empresas iniciarem processos de treinamento interno ou parcerias com empresas de educação especializadas, visando reposicionar e qualificar seus profissionais.
Antes mesmo da pandemia, esse mercado já era marcado por autodidatas, pessoas que, com uma boa dose de força de vontade e empenho individual, conseguem aprender novas funções e habilidades técnicas e, como profissional de seleção de talentos, posso dizer que isso se tornou uma habilidade cada vez mais valiosa e procurada nos diversos perfis profissionais de tecnologia. Posso dizer, sem sombra de dúvidas para quem está começando a carreira, que há um mar de oportunidades.
No entanto, ressalto que minimizar esse gap entre oportunidades e escassez não é uma tarefa exclusiva das empresas, mas também dos profissionais, que precisam se atualizar constantemente.
Remoto ou presencial?
Voltar ou não para o escritório? Eis o dilema da maioria das empresas. Vários paradigmas foram quebrados durante a pandemia e, mesmo aquelas que não tinham políticas orientadas ao home-office, perceberam seus benefícios. Algumas até se precipitaram, dizendo que não voltariam mais ao modelo presencial e, à medida que a situação começou a ser controlada, acabaram voltando atrás. Fato é que tanto as empresas perceberam aumento na produtividade quanto colaboradores repararam o tempo perdido nos deslocamentos e até em distrações típicas de um ambiente corporativo.
Agora, é hora de definir novas políticas, criando trilhas de carreira específicas para quem vai se manter no remoto, no presencial e no híbrido. Uma vez que a infraestrutura adequada ao trabalho de casa foi estabelecida, assim como a adoção de ferramentas para comunicação e colaboração, o momento será de empatia e negociação. Empresas através de seus líderes e colaboradores terão que chegar a um consenso sobre o que funciona melhor para os dois lados.
Alta produtividade ou esgotamento físico e mental?
Sem ter que ir ao escritório, muitos profissionais passaram a iniciar a jornada mais cedo e terminar mais tarde. A produtividade explodiu, assim como o esgotamento físico e principalmente, mental. Uma pesquisa realizada pela Yoctoo apontou que mais de 40% dos profissionais relataram piora na saúde física e mental durante a pandemia. Foi uma mistura perigosa entre o excesso de trabalho – marcado principalmente por uma rotina intensa de reuniões – com a ausência de atividades físicas, sociais e de lazer, somadas ao medo da Covid-19.
Como consequência, as empresas descobriram que era necessário aprender a lidar com a saúde dos colaboradores – indo muito além dos convênios médicos. Muitas investiram em plataformas que permitiam terapias à distância, atividades físicas para serem feitas dentro de casa com o auxílio de um profissional da área, ao vivo e online, entre tantos outros recursos que surgiram para driblar a situação emocional extremamente negativa. Eis aqui um legado que deve perdurar, já que a pandemia evidenciou a necessidade de cuidarmos mais de nós mesmos e das nossas relações, sejam elas pessoais ou de trabalho.
Carreira única ou Multicarreiras?
Enquanto alguns mergulharam profundamente em suas carreiras atuais, outros se abriram para a possibilidade de diversificar. Assim, nasceu o termo slash, cunhado pela especialista em futuro do trabalho, Marci Alboher, que define o indivíduo que possui mais de uma atividade em segmentos distintos, ao mesmo tempo. Algo inimaginável para gerações anteriores.
Passando mais tempo em casa, abriu-se espaço para reflexões do tipo: o que, de fato, é importante para mim? Com empregos menos seguros e estáveis diante da crise, muitos buscaram um plano B – que em alguns casos, após um período de adaptação, até se tornaram a primeira opção. Mais que um complemento à renda, a diversificação nas carreiras evidencia a necessidade de autorrealização, onde se cogita até a possibilidade de ter um emprego para ganhar dinheiro e outro para trazer mais realização profissional. Afinal, um emprego preenche o presente, uma carreira preenche uma vida.
Hard ou soft skills?
Se aprendemos algo sobre isso nessa pandemia é que o conhecimento é perecível. Aquilo que resolvia o problema do meu cliente até ontem, hoje pode já não servir de muita coisa. Nesse sentido, o debate sobre as habilidades técnicas e comportamentais se reacendeu. E, mais do que nunca, ambas precisam andar lado a lado.
As soft skills são uma tendência, um diferencial. Muito disso se deve ao fato de que não adianta ter bons técnicos, mas que não entendam sobre o negócio da empresa, o seu papel dentro da organização e o impacto do que ela traz para o mundo. O pensamento crítico segue sendo a principal competência do futuro. Temos que ser capazes de enxergar o todo – e não somente as partes que nos cabem. Isso coloca em xeque a maneira como fomos educados. Não temos que aprender algo para passar nas provas. Temos que sair da bolha, ter repertório, experiências diferentes, valores e, principalmente, atitudes positivas.
Por isso, termino esse artigo dizendo que para 2022, a palavra de ordem será encontrar o equilíbrio entre todos esses paradoxos. O mercado deve apresentar um cenário econômico mais favorável, com uma maior tendência à estabilização do que vimos em 2020/2021. Caberá aos profissionais e, especialmente aos líderes, estar atentos às oportunidades dentro e fora de suas organizações, além de ouvir e observar o que atende melhor os seus times para, assim, trazer mais leveza e eficiência na transformação cultural que inevitavelmente suas empresas passarão neste novo mundo pós-pandemia.
* Paulo Exel é administrador de empresas com MBA em Gestão Estratégica de Negócios
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