Home CORPORATE ARTIGO O futuro dos ERPs: o que podemos fazer de diferente?

O futuro dos ERPs: o que podemos fazer de diferente?



Por Jander Martins *

À medida que a tecnologia se desenvolve, vamos aprendendo com ela. Ao longo da minha trajetória de mais 35 anos na indústria de softwares, tive a oportunidade de desenvolver sistemas de tudo quanto é jeito. Lá atrás, bem antes da internet, não tínhamos uma direção certa, então desenvolvíamos todo tipo de programa.

Criamos desde sistemas de controle de produção aos embriões daquilo que hoje se chamam ERPs. Tudo isso utilizando as tecnologias da época, tudo feito em mainframe, quando o conceito de client server nem existia. Mas, como ninguém tinha tecnologia, a demanda era absurdamente grande. Faltavam programadores. Faltava gente especializada.



Quando os grandes ERPs chegaram ao Brasil, traziam a proposta de integrar sistemas em uma única plataforma, a fim de atender as empresas de maneira eficiente. Os computadores mudaram muito  rápido, exatamente como está acontecendo agora.

Com o surgimento da microcomputação, o computador foi para dentro de casa. A tecnologia saiu de um mercado que, até então, estava na mão dos governos e grandes empresas, e chegou às pessoas. E as pessoas, logicamente, começaram a criar novos mecanismos.

Retomo esse cenário de ebulição em 2019 por acreditar que estamos vivendo algo semelhante. Já faltam técnicos para atender às demandas de uma intensa transformação. A ideia de integração começou a revelar problemas. Enquanto os grandes ERPs seguem buscando ser solução “para tudo”, não avançam em vário aspectos. A conexão fiscal, por exemplo, não foi resolvida pelos ERPs. A conexão bancária também não.

Quando olho para o passado, vejo uma enorme relação com o que já estamos vendo e com o que veremos ainda mais no futuro. É que esse modo tradicional de fazer ERPs, que apelidei de “monolítico”, não é flexível e não é fácil integrá-lo a novas tecnologias. Não se consegue, hoje, conectar um sistema de gestão ao Facebook, ao Instagram ou ao Twitter.

Mas as redes sociais já representam novas formas de fazer vendas, de comprar e de interagir.  São essas novas formas que vão obrigar os ERPs a mudar, é indiscutível.

Naturalmente, não é possível prever o futuro, mas olhar o passado nos ajudar a compreender a possível direção. A revolução dos últimos tempos foi a internet, que transformou a comunicação. Antes, era preciso comunicar por carta, por telegrama… A internet permitiu novos modos de distribuição de insumos, tornou possível exibir na rede um vídeo, um blog.

Também mudou verdadeiramente a forma como os sistemas são feitos. Além disso, formou milhões de empreendedores que surgiram com as novas possibilidades.

Quando a comunicação via internet migra para o celular, tudo muda novamente. Transformam-se, mais uma vez, os modos como compramos e como vendemos. Como um ERP monolítico vai conversar com as tecnologias novas? Ele precisa ser quebrado em pedaços, precisa assumir novas formas de “falar”.

A demanda é por inovação. Porém, daqui por diante, inovação de verdade será fazer o mesmo de forma muito diferente. Na prática, isso já está acontecendo. A essência de se transportar, por exemplo, continua sendo ir de um lugar a outro. O modo diferente é o Uber.

Logo, é preciso inovar observando as transformações atuais. O que o mercado quer e como faremos diferença? O Instagram tende a se transformar em uma das plataformas de vendas mais populares do mundo. E os ERPs, infelizmente, ainda não estão prontos para isso. É preciso perceber o novo comportamento do consumidor para que consigamos atendê-lo.

Por outro lado, inovar tornou-se mais fácil. De casa, o programador cria o sistema e o torna acessível ao mundo. Os milhões de empreendedores que estão criando soluções terão uma exigência em comum: conexão. Portanto, os produtos do futuro terão de ser conectáveis. E baseados em microsserviços, em funções que possam realizar com máxima eficiência.

É a nossa cultura que está mudando. O celular virou uma plataforma para tudo. Se nós não embarcarmos nesses novos mecanismos, ficaremos para trás. Estamos lidando com um acesso nunca dantes visto a insumos e conhecimento. Há muita facilidade para desenvolver soluções baratas. Via Amazon ou Market Place, vende-se para o mundo todo.

O desenvolvedor de ERP tem que perceber, agora, que o cliente dele é seu concorrente no futuro. Magazine Luiza, por exemplo, tem 400 desenvolvedores de tecnologia dentro de casa. Amazon não é mais um varejo, é uma empresa de tecnologia. Ou seja, o cliente vai construir o core dele internamente e nós, desenvolvedores, precisamos oferecer soluções não possam surgir por lá. Senão, vamos vender para quem?

O caminho, parece-me, é a especialização. Ser muito bom em um determinado segmento será cada vez mais necessário. A lógica não é mais ser um grande ERP que “faz tudo”. O ERP do futuro vai criar microsserviços muito bem feitos. Estamos criando, por exemplo, um template tributário omnichannel, que se conecta a qualquer ERP e a qualquer máquina de vendas ou a qualquer sistema de adquirência. Essa é a criação diferenciada, criar o que ninguém tem.

Não vamos inventar uma nova lâmpada. Vamos criar aquilo que, nesse contexto de mudança, conseguiremos entregar com muita eficiência. E vamos poder, enfim, estar conectados ao que faz parte desse novo ecossistema. O ERP na nuvem já é um forma mais flexível de lidar com a gestão, por permitir conexão.

A pergunta é: como vamos dar conta de inteligência artificial, data science, internet das coisas, redes sociais, reconhecimento facial…? Já estamos lidando com lojas totalmente informatizadas, onde compra-se sem falar com ninguém. Se o banco não resolve o problema via WhatsApp, surge um novo modelo que resolve, e o cliente sai do banco. O Nubank cresce porque permite que se abra uma conta em dois minutos. Líderes de mercado estão deixando de sê-lo muito rápido.

A necessidade de reinvenção atingiu todos os segmentos. Precisamos estar cientes e caminhar para o negócio do futuro, conectado e especializado. A liderança sempre vai existir, e as grandes seguirão comprando as menores, mas nem sempre saberão dirigi-las.

É preciso assimilar essa nova cultura. O consumidor do futuro é alguém mais familiarizado com um tablet do que com um livro. Uma criança já compra um game usando o cartão de crédito do pai. Temos que estar presentes nisso. A disrupção não está surgindo dentro dos grandes ERPs, mas fora deles.

Quando eu era criança, existia um médico da família, que consultava e medicava todo mundo. Hoje, vamos a diversos especialistas. A mesma pessoa é atendida por dez médicos, e esses médicos não concorrem entre si. Os ERPs vão passar por algo parecido.

Não há outra saída senão a reinvenção.

 

* Jander Martins, fundador e CEO da Nexaa