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Os gigantes digitais e o novo cenário dos insumos agrícolas



Por Cintia Leitão de Souza *

Um novo cenário vem se configurando no mercado de venda e distribuição de insumos agrícolas no país. [read more=”Continuar lendo…” less=”Menos”]

Já há alguns anos, o movimento de fusões e aquisições está aquecido e assistimos à concentração de importantes players como Dow/Dupont, ChemChina/Syngenta e Bayer/Monsanto.

Entretanto, é importante ressaltar que o mesmo cenário vem se configurando internamente no agronegócio brasileiro, seja por movimentos destas grandes multinacionais, ou por empresas que se juntam para ganhar forças na acirrada competição de vendas de insumos no mercado interno, ou ainda, por aquisições de fundos de investimentos independentes ou empresas estrangeiras.



O Brasil vive um boom de investimentos de players que desejam uma posição de destaque no mercado brasileiro. Afinal, é aqui onde o agro tende a crescer e atender grande parte da demanda mundial por alimentos.

Um caderno publicado no início do ano pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), autoridade antitruste nacional, aponta que o órgão recebeu mais de 300 notificações de atos de concentração (AC) específicos ao segmento de comercialização de insumos agrícolas desde meados dos anos 90.

Considerando o universo apenas da venda de insumos agrícolas diante da gigante cadeia do agro, este número é muito relevante. Dados do mesmo estudo apontam que este mercado tem uma grande tendência de concentração em virtude dos altos investimentos em inovação, pesquisa e desenvolvimento, principalmente em biotecnologia.

E que esta concentração se justificaria pelo alto investimento em capital fixo que exige, em contrapartida, um alto retorno financeiro.

O mercado de insumos agrícolas é responsável por 3,5% do PIB nacional, porém estima-se que o “desempenho em termos de comércio internacional tem resultado líquido negativo: os saldos positivos das balanças comerciais de sementes e máquinas e implementos agrícolas são superados pelos resultados negativos encontrados nos segmentos de defensivos e fertilizantes” aponta o estudo (CADE, 2020). Razão da tendência à concentração.

Afinal, o que movimenta de fato os interesses, investimentos e movimentos relacionados aos insumos agrícolas?

Sem sombra de dúvida a resposta está nas informações preciosas que vêm do campo. São elas que determinam os volumes de importação e fabricação de agroquímicos e balizam todas as relações comerciais dentro deste ecossistema.

É com base no perfil, hábitos de consumos e comportamento dos agricultores que as empresas do setor se movimentam e investem. Tem mais poder competitivo quem detém mais informações sobre as safras e as tendências que ocorrerão com e dentro delas.

Esta é uma briga antiga dentro do agronegócio: o que pensa o agricultor, como ele compra e o que o faz optar por esta ou aquela empresa?

Para aqueles que não estão tão habituados com a composição desta dinâmica, o segmento se moldou ao longo dos últimos vinte anos (mesmo período citado pelo estudo do CADE) pelas relações de dependência comercial entre a indústria, canais de distribuição e agricultores. Nesta ordem.

Os canais de distribuição detinham o relacionamento com os agricultores em função do atendimento direto e da prestação de serviços ofertadas a eles. A indústria por sua vez, ditava as regras aos canais e davam as cartas do jogo através de programas de relacionamento, pagamento de rebates e financiamento de grande parte de movimentação das vendas.

Mas o cenário veio mudando com a adoção de tecnologias (principalmente biotecnologias) e com a independência financeira dos agricultores com maiores níveis de produtividade e rentabilidade. Estes, por sua vez, começaram a questionar de quem e quando comprar.

E o poder trocou de mãos. Os altos volumes da indústria nas revendas não foram se sustentando e a relação de dominância esmoreceu.

Agricultores brasileiros e inovação
Os agricultores brasileiros estão, reconhecidamente, entre os mais tecnificados e inovadores do mundo porque possuem o perfil empreendedor. Desbravaram não apenas áreas inexploradas do território nacional, mas também transformaram estas terras e testaram inovações.

Esta aptidão pelo desconhecido e pela inovação, contribuíram para alçar o país ao posto de líder mundial do no cultivo da soja. E não é só sobre a soja, os números do agronegócio são indiscutivelmente pujantes, quase todas as commodities ocupam as primeiras posições globais.

Empreendedores de um lado, eram considerados tradicionalistas ou tinham certa insegurança por moldar novos modelos de negócio, por outro. Houve uma certa incredulidade em relação a ceder a tantas ofertas de tecnologia para gestão e adotar processos com prática.

Eles aderiam às tecnologias de leitura de níveis de umidade e fertilidade de solo, às leituras de variações de clima, mas ainda refletiam sobre tomar decisões centradas em dados. O novo momento impulsionou todos ao digital. E o digital convenceu no primeiro momento em que mostrou trazer mais dinheiro.

Os dados não apenas impulsionam os negócios e as lavouras, mas melhoram a performance e a rentabilidade. E assim o agro tem se transformado em digital.

Fazendo um paralelo ao nosso de tema, o agricultor tecnificado, com dados integrados em toda a “porteira para dentro” é o sonho de todas as empresas ligadas à comercialização de insumos agrícolas. Informações valiosíssimas. O que ocorre, porém, é que, com dinheiro no bolso e informações nas mãos, o agricultor se tornou independente e muito mais exigente.

Ele compra de quem oferta mais (e aqui não falamos de preço), mas sim de quem oferta mais valor ao negócio dele. Desta forma as relações de interdependência entre a indústria e os canais de distribuição começaram a ruir.

Cada vez mais é cada um por si, e os agricultores dando as cartas do jogo a todos. O poder na mesa de negociação trocou de mãos e o agricultor decide o mix de produtos que compra, de quem e quando o faz.

Assim não causa estranheza os recentes anúncios de grandes empresas de agroquímicos embarcando no desenvolvimento de tecnologias e oferta de serviços digitais. Estão mudando o core dos negócios? Muito provavelmente, não.

É que, apenas através da oferta destes serviços diferenciados é que vão conseguir entregar maior valor e informação aos negócios dos agricultores e, em contrapartida, usufruir deste conteúdo para tomada de decisões.

Esta é a nova configuração do agronegócio nacional. Muito ainda há por vir se entrarmos no mérito das discussões e análises de que os agricultores não gostam ou, não gostariam, de compartilhar suas informações com outrem. Levará mais, quem ofertar mais.

Abre-se uma corrida contra o tempo, pela liderança e diferenciação neste mercado. Partem nesta jornada de tecnologias e estratégias de serviços a indústria de insumos, revendas e cooperativas agropecuárias.

Algumas ampliam ou inauguram lojas próprias, outras prestam serviços de BI (business Intelligence), outras vendem os produtos aplicados e ainda há as que desenvolvem o e-commerce para que o agricultor não precise mais deixar sua fazenda ou delegar as decisões aos gerentes que recebiam as visitas dos consultores a campo.

Chats, ferramentas de CRM, tablets, IoT, são algumas das novas ferramentas que chegam ao campo. E não são apenas elas, com elas vêm os novos perfis, cada vez mais pessoas que entendam e tenham vivência do mercado e de tecnologias. É possível que se monitore tudo e que se tomem todas as decisões à distância.

Esta é uma boa briga, enquanto o mercado de insumos agrícolas briga para saber quem oferta mais, quem ganha é o campo e o digital.

 

* Cintia Leitão de Souza é Head do Segmento de Agronegócio da Senior Sistemas

 

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